sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Sem saída, pacientes lotam pronto-socorro

Precariedade faz rede particular viver mesmo tipo de problema do SUS. Para conseguir tratamento para casos simples, os clientes têm que recorrer às emergências
A demora na marcação de consultas pelos prestadores de serviços dos planos de saúde já provoca um efeito colateral: o congestionamento das alas de emergência e dos pronto-socorros dos hospitais. Foi o jeito encontrado pelos beneficiários dos convênios para garantir o atendimento médico mais rapidamente. "É o mesmo problema que ocorre, há tantos anos, com o SUS", constata o presidente do Sindicato dos Hospitais do Estado de São Paulo (Sindhosp), Dante Ancona Montagnana.
"Com poucos médicos credenciados, quem sofre são os pacientes, que não conseguem marcar consultas. Isso os leva às emergências, que ficam sobrecarregadas, da mesma forma como ocorre no sistema público. Hoje, nos melhores hospitais do país, o tempo de espera médio em uma emergência é de duas horas", acrescenta o vice-presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), Aloísio Tibiriçá Miranda, vice-presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM).
A situação chegou a um ponto tão crítico, reconhece o diretor de um grande hospital privado de Brasília, que está havendo uma "invasão" das emergências de casos não tão urgentes. Em determinados horários, diz ele, os atendimentos clínicos que poderiam ser resolvidos em um simples consultório médico representam a maioria — uma total inversão dos objetivos dos pronto-socorros. "Esse embate não interessa a ninguém. As operadoras fazem uma economia burra, porque, ao não conseguir atendimento ambulatorial, problemas simples são agravados. Uma gripe, por exemplo, pode evoluir para uma pneumonia gerando custos elevados para a prestadora com a internação", emenda.
Além de sobrecarregar as urgências, a saída encontrada pelos pacientes para agilizar o atendimento resulta em diagnósticos fragmentados, uma vez que, a cada consulta ou pedido de exame, a doença é avaliada por um médico diferente e praticamente não há retorno. "Estamos diante do caos. O SUS se tornou um problema para a população e, agora, os planos de saúde, que são caríssimos, estão falhando e rasgando unilateralmente os contratos", diz um técnico do governo, assustado com a leniência da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), à qual caberia botar ordem na casa e garantir o mínimo de respeito à população.
Entre os beneficiários da saúde privada, não falta quem tenha recordações negativas em relação ao serviço prestado. A aposentada Alba Lúcia Fernandes, 55 anos, relata ter grande dificuldade para conseguir agendar consultas, exames e tratamentos. "Procuro ir com frequência ao médico, mas é sempre a mesma história. Se o médico pede um exame, é mais um mês, e, depois, outros 15 dias para a consulta de retorno e, enfim, um diagnóstico. O constrangimento é generalizado, e o pior é que estou pagando por isso", desabafa.
Silêncio
O perito criminal Frederico Rezende, 42 anos, diz ter perdido a paciência. "Tentei marcar uma consulta com um clínico geral e fui informado que demoraria um mês. Então, decidi fazer um teste: liguei de novo e disse que, em vez do convênio, faria a consulta particular: o prazo para o atendimento caiu para dois dias", conta. O que mais o atormenta é que não há uma só voz a favor dos conveniados. A ANS, que havia fixado prazos máximos para a realização de consultas e procedimentos, cedeu à pressão das empresas e, em vez de 19 de setembro, a medida só passará a vigor no fim deste ano — isso, se não houver outro adiamento.
Para o presidente da Federação Nacional dos Médicos (Fenam), Cid Carvalhes, o governo precisa agir rápido para evitar o pior. Não é possível, segundo ele, que o consumidor pague por serviços tão caros e, ao mesmo tempo, tão deficientes. Procuradas pelo Correio, as associações que representam as operadoras — Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge), União Nacional das Instituições de Autogestão em Saúde (Unidas) e a Federação Nacional de Saúde Suplementar (Fenae-Saúde) — não se manifestaram.
Faltam profissionais
Um balanço sobre as reclamações dos conveniados demonstra que está quase impossível encontrar médicos que atendam pelo convênio nas áreas de pediatria, dermatologia e de cirurgia reparadora. Em casos de queimaduras graves ou de acidentes que resultem em danos ao corpo, o conveniado terá de recorrer ao SUS ou se conformar com sequelas irreversíveis — ou até mesmo correr o risco morrer.


Por Gustavo Henrique Braga e Ana D"angelo


Fonte: Correio Braziliense

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