sábado, 16 de abril de 2011

A ORDEM DOS MÉDICOS É CONCRETAMENTE POSSÍVEL!

Alternativas: Fusão das entidades ou prerrogativas e atribuições da OAB

Não restam dúvidas de que os médicos de norte a sul de leste a oeste desejam que o debate sobre a ordem dos médicos seja feito.
Uns, tomam como exemplo a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), especialmente por sua atuação, na história recente, pela redemocratização do país e, desde há muito a partir das intervenções que tem realizado em favor dos interesses da cidadania.
Outros, além dessa premissa, consideram que a OAB é a única entidade dos advogados e daí deriva a força dos advogados. Estes defendem a fusão das entidades médicas numa só a que passaram a denominar Ordem dos Médicos do Brasil (OMB).
O que, em síntese, uns e outros desejam é uma entidade que, ao lado de apoiar o exercício ético da medicina, produza intervenções em defesa de um sistema de saúde público com qualidade; que no sistema de saúde suplementar atue com a Agência Nacional de Saúde (ANS), Ministério Público e órgãos de defesa do consumidor, regulando, fiscalizando e defendendo os consumidores e prestadores dos planos de saúde; que lute pelos direitos e garantias fundamentais; que em colaboração com a vigilância sanitária, auxilie na implantação da política de medicamentos e que também, em defesa da medicina, fiscalize e julgue os ilícitos éticos. Acreditamos ser essa a Ordem dos Médicos desejada por todos.
Aos recordarmos o passado, se cria condições para, no futuro, dar passos mais firmes no rumo certo, evitando a repetição de equívocos. Quando o esgotamento do modelo liberal agravou a crise econômica em nosso país, nos primeiros anos do século passado, os médicos foram diretamente atingidos. Nesse contexto, antes mesmo da quebra da bolsa de valores de Nova Iorque, em 1929, se debatia como combater o charlatanismo e o curandeirismo.
É nessa oportunidade que surge em nosso país, a partir do recém criado Sindicato Médico do Brasil, a idéia de construção de outros sindicatos. Aceleradamente, em curto espaço de tempo, nos vários estados brasileiros foram fundados sindicatos médicos.
Já, naquela época, os estatutos estabeleciam como um dos objetivos dos recém criados sindicatos a defesa do exercício ético da medicina. Um Código de Ética Médica foi, inclusive, adotado.
O modelo de sindicato fiscalizando o exercício ético da profissão vigora até hoje entre os jornalistas. O sindicato independente e livre das amarras impostas aos órgãos públicos tem revelado amplas condições de defender os jornalistas e, ao mesmo tempo, fiscalizar o exercício ético da profissão. Tais atributos também são úteis e fundamentais na luta pela redemocratização.
Entre nós médicos, a atribuição de controle ético da medicina, apesar de permanecer na esfera privada, passou para a as Associações Médicas. A inscrição era realizada no Ministério da Saúde, o controle ético era atribuído às Associações.
No final da década de 50 uma intervenção política estatal, que nem mesmo no Estado Novo ocorrerá, retira o controle ético da medicina (fiscalização e julgamento do exercício profissional) das Associações e o transfere para o recém criado Conselho Federal de Medicina. A intenção, segundo notícias, era transformar as Associações Médicas em meras entidades culturais e recreativas e a idéia teria nascido em decorrência de desentendimento político que envolveu médicos em Minas Gerais, um deles, o presidente da república.
Resquícios embrionários dos sindicatos e das associações ainda são observados na lei que criou os Conselhos. Pode-se até dizer que os Conselhos são filhos dos sindicatos, o pai que os financiou desde o início e das Associações médicas, a mãe que transmitiu a atribuição de preservar, pela educação ética e pela fiscalização, o bom nome da medicina e o julgamento dos médicos.
Ao compararmos os dois momentos, o liberal, da década de vinte em seus estertores, com o confuso momento neoliberal, hoje em franca decadência, a história se repete.
Desde a luta pela regulamentação da medicina, passando pelo combate ao exercício ilegal, pelo curandeirismo e pelo charlatanismo, hoje sob outras vestes, é similar à luta travada no início do século XX.
Mais recentemente, parcela do movimento sindical debateu a questão da Ordem dos Médicos do Brasil. Em evento realizado na cidade de São Paulo, estiveram presentes representantes do Conselho Federal da OAB, seccional de São Paulo, do Sindicato dos Advogados de São Paulo, da Associação dos Advogados e do Instituto dos Advogados. Os advogados manifestaram surpresa com a proposta de fusão das entidades médicas em uma só. Destacaram, na oportunidade, que tinham nas entidades médicas modelo que vinham adotando.
No evento, pudemos constatar alguns aspectos, especialmente os relacionados à fusão, que interessavam mais às associações e sociedades de especialidades, detentoras de patrimônio privado relevante. Um aspecto da discussão foi em relação ao destino do patrimônio após a fusão com o CFM, uma autarquia pública federal. O patrimônio privado dos médicos, presente nessas associações e sociedades, seria incorporado ao do órgão público, ou teria outro destino?
O contexto da época em que os conselhos foram criados era outro. A grande maioria dos médicos atendia predominantemente em consultórios particulares. Os médicos que prestavam atendimento em hospitais o faziam nas Santas Casas e Hospitais Públicos.
Nos últimos 20 anos houve uma inversão nesse quadro. Cresceram as contratações públicas e o atendimento particular passou a ser intermediado pelos planos de saúde. É nesse contexto que os conselhos navegam com dificuldades. A composição do órgão praticamente continua a mesma e o número de processos éticos a cada dia aumenta.
Objetivamos um Conselho Federal da Ordem dos Médicos do Brasil como o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, com as mesmas prerrogativas e atribuições. É necessário que, em função das atribuições acrescentadas aos Conselhos, o número e composição sejam adequados à realidade atual. Também a contratação de assessorias, com vistas a garantir a qualidade dos julgados. Para isso o financiamento deve ser público. Desonerar os médicos que financiam a autarquia pública é um caminho para que a nova Ordem funcione adequadamente e com mais independência.
Os juízes e promotores possuem imunidade quando se manifestam com base no livre convencimento, e por isso não podem ser responsabilizados. Atualmente os conselheiros podem ser processados em decorrência de eventuais danos causados pelos resultados dos julgamentos éticos. Dar essa imunidade aos conselheiros de medicina é fundamental.
Dar garantias para que os julgados, desde que atendidos requisitos constitucionais e legais, tenham força de sentença é outro ponto que deve ser defendido. Os conselhos devem ser transformados em verdadeiros tribunais éticos. Para isso, a lei deve ser mudada.
Outra possibilidade para a criação da Ordem dos Médicos, e talvez mais viável, é o caminho inverso percorrido até aqui. Adotar a experiência dos anos vinte, qual seja, a transformação dos conselhos em entidades privadas que, à semelhança do que ocorre com os sindicatos dos jornalistas, têm atribuições de defesa profissional e de fiscalização.
Um dos inconvenientes é que, como no caso dos jornalistas, a inscrição profissional ficaria como já ficou, por conta dos ministérios do trabalho ou da saúde.
A alternativa de privatização, viabilizaria a fusão das entidades médicas. É fundamental observar que o resultado dessa fusão, diferentemente da pública, não redundaria, necessariamente, no estabelecimento de regras indenizatórias, para, por exemplo, os sócios das 53 sociedades de especialidades.
De acordo com esse modelo a Ordem dos Médicos do Brasil seria privada e representaria a todos. Como a Ordem, os patrimônios material e intelectual das sociedades, dos conselhos e dos sindicatos, pertenceria a todos os médicos.
Essa alternativa parece ser a mais viável. Contudo, é bom lembrar que a retirada das prerrogativas dos sindicatos médicos de zelarem pela defesa do exercício ético da medicina, passando-a para as associações médicas e por último para os conselhos, aconteceu de forma legal. A criação da Ordem dos Médicos do Brasil parece interessar a todos os médicos. Resta ouvir a sociedade.

* Mario Antonio Ferrari – Presidente do Sindicato dos Médicos no Estado do Paraná - SIMEPAR e 1º Vice-presidente da Federação Nacional dos Médicos - FENAM

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